O autor deste texto é João Pereira Coutinho, jornalista. Vale a pena ler!
"Não tenho filhos e tremo só de pensar. Os exemplos que vejo em volta não aconselham temeridades. Hordas de amigos constituem as respectivas proles e, apesar da benesse, não levam vidas descansadas. Pelo contrário: estão invariavelmente mergulhados numa angústia e numa ansiedade de contornos particularmente patológicos. Percebo porquê. Há cem ou duzentos anos, a vida dependia do berço, da posição social e da fortuna familiar. Hoje, não. A criança nasce, não numa família mas numa pista de atletismo, com as barreiras da praxe: jardim-escola aos três, natação aos quatro, lições de piano aos cinco, escola aos seis, e um exército de professores, explicadores, educadores e psicólogos, como se a criança fosse um potro de competição.
Eis a ideologia criminosa que se instalou definitivamente nas sociedades modernas: a vida não é para ser vivida - mas construída com sucessos pessoais e profissionais, uns atrás dos outros, em progressão geométrica para o infinito. É preciso o emprego de sonho, a casa de sonho, o maridinho de sonho, os amigos de sonho, as férias de sonho, os restaurantes de sonho.
Não admira que, até 2020, um terço da população mundial esteja a mamar forte no Prozac. É a velha história da cenoura e do burro: quanto mais temos, mais queremos. Quanto mais queremos, mais desesperamos. A meritocracia gera uma insatisfação insaciável que acabará por arrasar o mais leve traço de humanidade. O que não deixa de ser uma lástima.
Se as pessoas voltassem a ler os clássicos, sobretudo Montaigne, saberiam que o fim último da vida não é a excelência, mas sim a felicidade!"
Obrigada Carolina pela partilha! *
5 comentários:
Um texto muito justo e relata na plenitude as famlias e crianças de hoje!
"A meritocracia gera uma insatisfação insaciável que acabará por arrasar o mais leve traço de humanidade" -> subscrevo! e realço: "A criança nasce, não numa família mas numa pista de atletismo".
Sabe bem ler estes apontamentos de alguém lúcido.
bjs
hmmm faltou mais um realço: o título. Tão simples e tão completo. Este ele (M) vai agradecer!
Sarah,
És um doce de pessoa!;)
Obrigada! Nesta casinha recebo muitos miminhos. Sinto-me confortável. Obrigada!!
Um texto interessante... completo, verdadeiro e justo!
Brigada pla partilha!
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